Nuno Camelo, membro do grupo SSCC de Évora, participou, no passado dia 3 de março, no Retiro Quaresmal da Família Salesiana, que teve lugar nos Salesianos de Évora.
Inspirado por um dia de reflexão, partilha, oração, enviou-nos este testemunho…
Retirou-se. Sofreu. Voltou para dar vida!
O deserto é inóspito. A vida é dura. O tempo é escasso. O silêncio tarda. Tudo o que é necessário para poder ter a consciência da importância de parar o ritmo, abrandar os dias, regressar ao essencial, tudo isso, oferecido num ambiente de partilha, oração e introspeção.
Entrar no “deserto” dos dias, conseguir trancar todas as portas dos nossos afazeres, desligar o cérebro e colocar à carga o nosso coração, eis a proposta do retiro quaresmal vivido nas comunidades Salesianas da Província Portuguesa.
Aparentemente ninguém é feliz no deserto, nem capaz de se encontrar, mas a verdade é que essa rudez do nada e esse abandono do silêncio, marca, desassossega e obriga a que te procures, e que nessa procura possas contar apenas contigo e com o Senhor teu Deus. Quando tu chegas, vindo de casa, vindo da tua vida, deixando os teus ainda a dormir a sono solto, chegas só. Ficas no carro ainda a pensar se queres mesmo aquele deserto, porque tens a certeza de que o confronto contigo próprio naquele silêncio, vai doer um pouco, pois ao teu coração vibrante, cheio de vida e ação, falta por vezes encerrar mais cedo, ficar apenas no interior depois de apagadas as luzes da festa, faz falta ouvir-se, deixar-se ouvir, ficar apenas prostrado e só.
Quando tu te retiras, chegas ao deserto que és tu a fugir de ti e ficas apenas parado. O teu deserto dos dias tem falta de água, de vida e de sombras. Sobra silêncio, falta ar para respirar porque paraste, quem te alimentava era o barulho e agora ficas sem jeito, perante o nada, encontras-te em desvantagem porque és tu contigo próprio. Sofres em coisas poucas, diria nada a maior parte das vezes. A vida vai-te sempre sorrindo, mesmo que te queixes, sabes que existe uma cruz à tua medida. Sofres com coisas grandes e não deixas de lutar contra elas, mas a verdade é que também estás cansado.
Parece que o Senhor não está no deserto. Tal como a Ele lhe pareceu que Deus não estava lá, na sua agonia quaresmal, na sua entrega. Parece que o silêncio afinal é o Senhor a falar-te ao ouvido, colocando ordem na tua cabeça porque o espaço dado na alma faz funcionar o coração de outra forma. Fazes os paços dolorosas da via que és tu enquanto caminho que os outros podem percorrer. Caies. Levantas. Tornas a cair e não permaneces no chão. Pedes ajuda. Negas ajuda. Segues.
Quando fazes silêncio, isso renova a tua vida. Se o fazes sem medo, isso renova outras vidas contigo. Voltei, capaz de reconhecer a abundância que é a minha vida, deixando o deserto, mas trazendo comigo o Senhor. Cristo está vivo. Saiu do sepulcro que era eu…
Nuno Camelo, SSCC Évora