FS | A Quaresma

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Os acontecimentos destes tempos recentes não dão nem serenidade ao nosso espírito, nem tranquilidade ao nosso coração. E não são apenas os acontecimentos em si, que esses, apesar de graves e dolorosos já têm matéria assustadora suficiente, mas é também todo o alarido que à volta deles se fez e se faz. E foi a pandemia da Covid-19 que, de manhã à noite, nos bombardeou com notícias verdadeiras, e com notícias menos verdadeiras, mas oportunistas, com avisos, com estatísticas, com gráficos, com comentadores que todos os dias apareciam como cogumelos apanhados em incertas florestas. De repente, das emissões televisivas, das emissões de rádio e das páginas dos jornais quase desapareceram as notícias e os comentadores rumaram a outras paragens. Chegou um outro flagelo: a guerra, gerada pela invasão da Ucrânia. O cenário noticioso montou-se rapidamente e agora, de manhã à noite, são notícias atrás de notícias, repetidas de maneira, às vezes divergente, pelas diversas fontes noticiosas. Vivemos na incerteza, à espera de que tudo acabe o mais rapidamente possível, porque o sofrimento e a morte afligem irmãos nossos e a nós também.

Dois anos de pandemia da Covid-19 e alguns dias de tanto sofrimento com o que acontece na Ucrânia são para nós lições de vida, apelos à conversão do coração humano, esperança de uma Humanidade nova nascida das lições da dor e da adversidade? Certamente poucos de nós terão a coragem de arriscar a afirmação positiva.

Entretanto, de forma humilde e quase silenciosa, a Quaresma fez a sua entrada sem holofotes, sem anúncios sensacionalistas, apenas porque muitos de nós preferimos o seu silêncio eloquente ao atordoamento das vozes que nos escondem o essencial da vida. Podemos assim perguntar-nos: onde está a razão das pandemias, das guerras que matam e tanto fazem sofrer, de tanto mal que assola o nosso mundo? E, com espanto, encontramos a resposta à nossa frente, procurada e lida nas Palavras da Escritura, nos avisos dos Profetas de todos os tempos, nas Palavras de Jesus. E todas nos remetem para o coração humano, que devia ser o lugar especial do Amor e que em tantos e tantos de nós se encontra vazio, duro como rocha, egoísta, acoitando indiferenças, ódios e desejos de destruição e de morte. Que misterioso é o coração humano! E Deus resolveu vir, pessoalmente, curar esse coração humano. Incarnou a nossa humanidade e ao começar a grande tarefa de ajudar a mudar o nosso coração, começou pelo silêncio de uma quaresma de oração, penitência e jejum. Também Ele começou por entrar dentro do Seu coração de carne, sofreu as tentações  de todos nós e disse por Palavras e Obras: é na santidade do coração que está a certeza da felicidade; é na verdade do coração que está a raiz da fraternidade; é no amor do coração que se encontra a vida.

A nossa Quaresma já começou e somos convidados a transformar o coração e nele repor a santidade de Deus, a Verdade de Deus, o Amor misericordioso de Deus. Passo a passo, na oração humilde de todos os dias, na fraternidade do nosso olhar para com todos, na partilha generosa do que temos e somos, acompanharemos Jesus que vai modificando o nosso coração, transformando-nos com Ele em vencedores da Vida.

Para todos, homens e mulheres de boa vontade, membros da Família Salesiana, uma profunda e santa Quaresma.

P. Joaquim Taveira da Fonseca
DNFS