O sonho das duas colunas e Fátima
Texto do livro de Antonio Socci — “Il Quarto Segretto”
No texto de Massimo Giraud lê-se, entre outras coisas, que “o Papa será perseguido” e no texto de Melânia — [a vidente de La Salette] — Nossa Senhora diz: “O Papa será perseguido por toda a parte, dispararão sobre ele, quererão matá-lo, mas nada lhe poderão fazer. O Vigário de Cristo triunfará uma vez mais”.
Não só isso. No assim chamado “segredo escatológico”, de Melânia leem-se as seguintes palavras de Nossa Senhora: “O Santo Padre sofrerá muito. Estarei com ele até o fim para receber o seu sacrifício. Os maus atentarão várias vezes contra a sua vida, sem poder porém prejudicar os seus dias; mas nem ele nem o seu sucessor verão o triunfo da Igreja”.
Antonio Galli chama a atenção para estas palavras e para as de Maximino, na carta ao Papa Pio IX, onde fala de um Papa que “ninguém esperava”. Depois, noutra passagem, o menino confidenciou, entre muitas inexatidões, que aquele Papa não seria “romano”, talvez quisesse dizer italiano, que ele reinaria vinte anos, e que ele, Maximino, não quereria estar em seu lugar, dando a entender que o Papa sofreria muito. Desses dois documentos e dos outros esclarecimentos de Melânia, escreve Galli, “é fácil deduzir que esse pontífice é João Paulo II; de facto, “ninguém esperava que ele fosse eleito… o seu reinado já ultrapassou os vinte anos. Sofreu vários atentados contra a sua vida como disse Melânia”. Com efeito, além do atentado de 13 de Maio de 1981, o Papa Wojtyla sofreu outro atentado em 13 de Maio de 1982.
É fácil constatar que é o segredo de La Salette — (Não o segredo de Fátima) — que corresponde perfeitamente aos acontecimentos ocorridos com João Paulo II. Foi contra a vida dele que se fez um atentado, e foi ele, porém, que foi salvo por proteção da Virgem. Depois, há outra profecia formulada em Fátima, a de um Pontífice que é assassinado. O mesmo Galli — considerando o texto de Lúcia — pergunta: “Poderá tratar talvez de um outro Pontífice que morrerá mártir?”. Parece evidente que com estas duas grandes profecias públicas, feitas por Nossa Senhora nas duas fundamentais aparições modernas reconhecidas pela Igreja, nos encontramos diante de uma trágica escalada da História cristã que culmina com um Papa ferido, (mas não morto), e com um seu sucessor, por sua vez, martirizado. Provavelmente a série de aparições públicas de Nossa Senhora na Idade Moderna — com características totalmente especiais em comparação com a precedente história da Igreja — finalmente deveria ser avaliada no seu conjunto, como um ciclo profético que tem relação com um particularíssimo momento da História da Cristandade.
A minha hipótese de uma dupla profecia referente a dois papas pode encontrar uma confirmação numa atenta leitura das três partes do Segredo de Fátima. De facto, na segunda parte, em concomitância com certos eventos históricos, Nossa Senhora fala de um Papa que “terá muito que sofrer”, na terceira parte da visão mostra um Pontífice que será martirizado (junto com uma quantidade de outros cristãos), no contexto de uma prova apocalíptica para a Igreja, no final da qual o Imaculado Coração de Maria triunfaria.
Esta sucessão de eventos encontra-se – curiosamente – também num célebre sonho profético de São João Bosco chamado “O Sonho das Duas colunas” que o santo turinense contou a 30 de Maio de 1862. Tornemos a ler esse sonho:
“Imaginai estar comigo na praia do mar, ou melhor, sobre um escolho isolado, e de não estar em torno de vós senão o mar. Em toda aquela vasta superfície de águas vê-se uma multidão de naves em ordem de batalha, que avançam contra uma nave muito maior e mais alta que todas, tentando chocar-se contra ela com o esporão da proa, tentando incendiá-la e fazer-lhe o maior dano possível. Àquela majestosa nave fazem escolta pequenas naves, mas o vento lhes é contrário e o mar agitado parece favorecer os inimigos.
No meio da imensa extensão do mar elevavam-se acima das ondas duas robustas colunas, altíssimas, pouco distantes uma da outra. Sobre uma delas havia a estátua da Virgem Imaculada, a cujos pés pendia um longo cartaz com esta inscrição: Auxilium Christianorum; sobre a outra, que era muito mais alta e mais grossa, havia uma Hóstia de grandeza proporcional à coluna, e em baixo havia um outro cartaz, com as palavras: Salus Credentium.
O comandante supremo da grande nau, que é o Romano Pontífice, vendo o furor dos inimigos e o mau partido em que se achavam os seus fiéis, convoca em torno a si os pilotos dos navios secundários, para ter um conselho e decidir o que se deveria fazer. Todos os pilotos sobem e se reúnem em torno do Papa. Mantêm uma reunião, mas, enfurecendo-se cada vez mais a tempestade, são mandados de volta para seus próprios navios.
Ocorrendo um pouco de calmaria, o Papa reúne os pilotos de novo, pela segunda vez em torno de si, enquanto a nau capitania segue o seu curso. Mas a borrasca volta espantosa.
O Papa permanece no timão, e todos os seus esforços são dirigidos a levar a nau para o meio daquelas duas colunas, de cujo cimo pendem, em toda a volta delas, muitas âncoras e grossos ganchos presos a correntes.
Os navios inimigos movem-se todos a assaltá-la e fazê-la submergir: algumas com os escritos, com os livros, com matérias incendiárias de que estão cheias, que procuram jogar-lhe a bordo; outras com os canhões, com os fuzis, e com os esporões. O combate se torna cada vez mais encarniçado; mas inúteis se revelam os seus esforços: a grande nave continua segura e franca no seu caminho.
Entretanto, os canhões dos assaltantes explodem; os fuzis e as outras armas quebram-se e muitos navios se desconjuntam e afundam no mar.
[Em vão tentam de novo o ataque e desperdiçam toda a sua fadiga e munições: a grande nau prossegue seguramente e livre em seu caminho. Ocorre por vezes que, atingida por golpes formidáveis, apresenta em seus flancos largas e profundas brechas, mas apenas acontece o dano, sopra um vento proveniente das duas colunas e as brechas se fecham e os furos se obturam] (Trecho do sonho de Dom Bosco omitido no texto de Antonio Socci).
Então, os inimigos, furibundos, começam a combater com armas curtas; e com as mãos, com os punhos, com blasfêmias.
De repente, o Papa, ferido gravemente, cai. Imediatamente, ele é socorrido, cai uma segunda vez e morre. Um grito de vitória e de alegria ressoa entre os inimigos; sobre os seus navios se dá um indizível tripudio. Eis que apenas morto o Pontífice, um outro Papa o substitui em seu posto. Os pilotos reunidos o elegeram tão subitamente que a notícia da morte do Papa chega junto com a notícia da eleição do seu sucessor. Os adversários começam a perder a coragem.
O novo Papa, superando todo obstáculo, guia o navio até o meio das duas colunas e então com uma corrente que pendia da proa o une a uma âncora da coluna sobre a qual estava a Hóstia, e com uma outra pequena corrente que pendia da popa o prende do lado oposto a uma outra âncora, que pendia da coluna sobre a qual estava colocada a Virgem Imaculada.
Então, aconteceu uma grande reviravolta: todos os navios inimigos fogem, dispersam, e chocam. Uns naufragam e procuram afundar os outros, enquanto navezinhas que tinham combatido valorosamente com o Papa veem elas também a atar-se àquelas duas colunas. [Muitas outras naus que, tendo-se retirado por temor da batalha. Se acham em grande distância, ficam prudentemente observando, até que, desaparecidos nos abismos do mar os restos de todos os navios destroçadas, com grande vigor vogam em direção daquelas duas colunas, onde, chegando, se prendem aos ganchos pendentes das mesmas colunas, e aí ficam tranquilas e seguras, junto com a nau principal, sobre a qual está o Papa]. (Outro trecho omitido na versão do sonho citado por Antonio Socci)
No mar reina uma grande calma”. Depois de ter contado este sonho, Dom Bosco pediu uma interpretação a Dom Rua, que disse: “Parece-me que a nave do Papa seja a Igreja, os navios, os homens, o mar, o mundo. Aqueles que defendem a grande nave são os bons, afeiçoados à Igreja; os outros, os seus inimigos. As duas colunas de salvação parecem-me que sejam a devoção a Maria Santíssima e ao Santíssimo Sacramento da Eucaristia”.
“Disseste bem”, comenta Dom Bosco, “é preciso apenas corrigir uma expressão. Os navios dos inimigos são as perseguições. Preparam-se gravíssimas provações para a Igreja. O que aconteceu até agora é quase nada comparado com o que vai acontecer. Restam apenas dois meios para salvar-se de tanta confusão: devoção a Maria Santíssima e Comunhão frequente”.
O sonho, à luz dos acontecimentos hodiernos, é de fácil interpretação no seu conjunto. Mas Schuster procurava aplicar esse sonho aos acontecimentos ocorridos até então, quando em vez, hoje, nos é evidente que muitos daqueles eventos devem ainda verificar-se.
Algumas de suas particularidades aparecem-nos perfeitamente reconhecíveis, e a sua colocação cronológica no suceder-se dos eventos impressiona realmente pela precisão e dá muito crédito ao seu valor profético. Impressionante é que Dom Bosco estando a falar no ano de 1862, anuncie duas reuniões dos pilotos em torno do Comandante Supremo: uma clara profecia dos dois Concílios (O Vaticano I e o Vaticano II), convocados para enfrentar o ataque do mundo, o primeiro dos quais – o Vaticano I – foi com efeito interrompido (como previa o “sonho”) pelo enfurecimento da tempestade, pois, de fato, Roma foi invadida em 20 de Setembro de 1870 e foi posto fim ao poder temporal [do Papa], após séculos, tendo o Papa ficado recluso no Vaticano.
A imagem da Igreja atual, como sacudida por uma tempestade que parece a pique fazê-la afundar é a mesma imagem que o Cardeal Ratzinger utilizou naquela dramática Via Crucis da Sexta Feira Santa de 2005, que ele escreveu para o Papa já então muito mal de saúde. Aquele texto impressionante — certamente aprovado por João Paulo II – em certo sentido representa um apelo conjunto desses dois grandes Papas, e – visto a posteriori – o primeiro episódio providencial que levará dali a pouco Ratzinger a suceder ao Papa Wojtyla. Foi quase uma sua investidura oficiosa. Portanto, na oração da nona estação, o Cardeal escreveu estas dramáticas palavras: ‘senhor, frequentemente a tua Igreja nos parece uma barca que está prestes a afundar, uma barca que faz água por todos os lados. E também em teu campo de trigo vemos mais joio do que trigo.
É evidente, além disso, que, — após os dois Concílios —, os dois outros eventos profetizados pelo sonho são o ferimento do Papa e, depois, o seu martírio, que parece dar a impressão de um prevalecimento das forças do mal. Enfim, dentro de uma situação muito particular, a chegada surpreendente de um Papa que ancora a Igreja ao Coração Imaculado de Maria e à Eucaristia, o que permitirá o triunfo. Hoje, — à luz de Fátima — podemos dizer que não se trata apenas de um pedido devocional, mas de uma reviravolta, de uma “conversão” da Igreja moderna, pelo seu modo de conceber-se diante do mundo e diante de Deus. Trata-se, por exemplo, de remeditar aquele solene ato de consagração da Rússia, (feito conjuntamente por toda a Igreja, Papa, Bispos e fiéis) ao seu Coração Imaculado, em vão pedido por Nossa Senhora de Fátima junto com outras coisas não atendidas (exatamente por essa surdez — em sucessivas locuções interiores — Lúcia compreendeu palavras gravíssimas de Jesus).
Trata-se de um retorno à Eucaristia, um ancoramento que significa também uma clara “conversão” à ortodoxia doutrinal depois das espantosas desordens posteriores ao Concílio, e, considero, também um retorno à adoração, portanto um retorno à liturgia bimilenária da Igreja, que foi liquidado com um golpe de mão no pós Concílio. Noto, de passagem, que estas “conversões” são exatamente as linhas do Pontificado de Bento XVI.
Duas “colunas” nas quais ancorar-se, que dariam realmente um rosto diferente à Igreja de hoje: mais adoradora do que mundana, pedindo de Deus a graça e a salvação, do que ocupada com seus próprios planos e projetos, com mais pulsações de coração do que debates. Uma Igreja que espera tudo de Cristo, e não da habilidade política, do ativismo e da mania de aggiornamento, uma Igreja não mais sufocada por “porcarias” e “joio”, (como denunciou o Cardeal Ratzinger). Prefigura-se, em suma, uma “metanoia” (uma conversão). Será depois de um tal retorno e de um tal ancoramento em Jesus e Maria que é profetizado o triunfo de seus Corações na presente história humana, e que é também a promessa final de Fátima: “O meu Coração Imaculado triunfará”.
”Os acontecimentos atuais à luz de Fátima e dos sonhos de D. Bosco” MONTFORT Associação Cultural
Pedro Miguel Pinheiro Ricardo
Presidente Nacional ADMA